terça-feira, 29 de abril de 2008

O 25 de Abril para gerações recentes

Ontem, numa aula de 12º ano, a "matéria" era o 25 de Abril e o processo revolucionário.
Antes, noutra aula, já tinha passado parte de um filme, "Outro País", do meu amigo Sérgio Trèfaut (tão português como os outros, pois que é filho de Miguel Urbano Rodrigues).
Uns gostaram, outros nem sei (e é isso que me custa, a falta de qualquer reacção).

Ontem, dizia, referia-se também o tema da Reforma Agrária. Reacção: quase nenhuma. Fiquei com a sensação de que falar da Reforma Agrária que aconteceu neste Alentejo, onde os pais e avós deles participaram, a favor ou contra, sem neutralidades, era quase o mesmo que falar em bananas.
A diferença é que as bananas não saem para o teste. Por isso, a Reforma Agrária suscita um pouco mais de atenção.

Não é que sejam menos inteligentes que os outros. Nem sequer desprezam o 25 de Abril. Até acham bem que se fizessem estas lutas e não desejam voltar ao antigamente. Estão habituados ao regime (mais ou menos) democrático, nasceram nele.

Um dos problemas é a "fartura". Estão habituados a serem levados aos hipermercados aos fins de semana. Estão habituados à televisão no quarto, ao computador, ao MP3, aos jogos.
Quando estudam, têm simultaneamente ligados o televisor, um qualquer (ou mais) aparelho de música, o computador ligado à Internet, fazem "downloads", têm e usam o MSN, recebem filmes do "YouTube", fotografias, têm o telemóvel ao lado, que também recebe voz e imagem. Não precisam de luz exterior, não precisam de distinguir as estações do ano, comem pizzas e hamburgueres a qualquer hora, saem para a discoteca a partir das tantas.

Com tudo isso ao mesmo tempo, será possível lerem? Lêem também, mas no meio disto tudo.
Já não se comovem com imagens. Textos, imagens, sons, já pouco provocam.Recebem-nos a toda a hora; uma música é mais um conjunto de sons. O "espanto" é passageiro, a efemeridade é a norma.

O problema já não é a televisão. É a pletora, é o tudo ao mesmo tempo com um cérebro que é igual aos homens do Paleolítico. O nosso, diga-se de passagem.

2 comentários:

José Manuel Chorão disse...

Aqui está um bom texto, uma caracterização clara e lúcida da actual geração de adolescentes; mas... será tudo isso mau ? Quando tu e eu fomos adolescentes, a geração dos nossos pais também olhava para nós com grande distanciamento cultural, com uma enorme desconfiança quanto aos nossos valores, à nossa qualidade ou capacidade de construirmos um futuro bom para nós e para o mundo. E, afinal de contas, saímo-nos assim tão mal ? Tudo somado, não me parece; o saldo acaba por ser positivo na maioria dos aspectos.
Eu não desacredito na actual geração de adolescentes; é verdade tudo o que escreves mas, apesar disso, acho-os melhor apetrechados para encarar o futuro do que nós estávamos na idade deles. Têm informação em maior quantidade do que podem 'digerir', é verdade; são mais acomodados do que nós eramos, é verdade; estão mais mimados do que nós fomos, tudo verdades. Mas alguma coisa, no meio da habitual estupidez e incultura de qualquer geração de humanos, alguma coisa na actual geração de adolescentes me faz acreditar que eles saberão colocar os seus tijolos nesta imensa construção que há milhares de anos vimos todos fazendo. Acredito neles (não em todos, mas em alguns que me parecem capazes).
E lembra-te de uma coisa: o mundo muda em cada geração; e isso é bom; ai deles se fossem iguais a nós. A diferença é salutar.

Fernando Évora disse...

Belo curto e claro texto, João. É isso mesmo o que mais nos magoa (penso que posso falar no plural): o estarem-se nas tintas para o que quer que seja. O não ter ideias, não ter opinião. Parece que é isso que os habitantes deste país (note que não usei o termo cidadãos) serão no futuro. É o rebanho, o "aborregamento" de que falava num destes dias o Saramgo, as salsichinhas insípidas e amorfas mas de aspecto apetitoso. É isso o que querem fazer do nosso futuro: um vazio de ideias e de opiniões, uma luta política gerida pela imagem publicitária e não pela ideologia. Remamos contra a maré, nós, alguns professores. Talvez seja por isso que somos alvo a abater.
Mas apetece-me dizer que morreremos de pé. Um abraço, camarada (como esta palavra recuperou sentido...)