terça-feira, 18 de junho de 2013

Dos comentadores e dos seus estudos não quotidianos



Continuo a dizer que o mal de alguns comentaristas profissionais é não se informarem. No mundo atual não dá para dar opiniões sobre tudo, como se fossem verdades indiscutíveis. Nunca deu! Percebo que se ganhe com isso, quando se tem fama. Mas fica mal, para já não falar de alguma desonestidade intelectual.
Sousa Tavares fala de uma escola primária numa aldeia perdida no Norte, onde terá andado. Havia frio, uma professora esmerada etc.
Lembra-se de coisas de há décadas. Sabemos que a memória nos trai. Lembramo-nos de coisas que nos emocionaram, de outras não. Felizmente não chega a fazer a apologia do Portugal dos pequeninos, dos que diziam, repetindo Salazar, que “a minha política é o trabalho” (o que significava não participar naquele terrível mundo urbano, cosmopolita, mas defender, mesmo contra os vizinhos, aquela sociedade autoritária, camponesa e patriarcal reinventada), mas … quase.
Também eu andei em escolas primárias com condições ínfimas, com o frio do Alentejo que não é menor que o do Litoral Norte. Também tive colegas, em Alter do Chão, que andavam descalços. Também eu tive colegas que todos os dias apanhavam reguadas e que nem se atreviam a dizer em casa, porque apanhavam mais. Também tive professores interessados nos seus alunos. Parece-me e tenho a certeza que ainda há muitos, muitos anónimos.
Mudei de escola primária para Sousel, também no Alentejo. Dos meus colegas da 4ª classe, que eu saiba apenas uns dois, talvez mais um, onde me incluo, tiraram um curso superior (ou o que o era na época), na idade “normal”. Outros ficaram pelo caminho e, não fosse haver um colégio, que nem todos podiam pagar, com condições hoje inacreditáveis, talvez outros não tivessem feito o ensino secundário ou parte.
Esquece-se, ao falar dessa escola, do ambiente que tinha em casa. Esquece-se dos livros que tinha, de uma mãe escritora e um pai jornalista e dos círculos de amigos da família. Também eu tive alguma “sorte” nesse aspeto. Mas a maioria não tinha.
Parte da sua experiência particular. Quase como se fosse possível voltar atrás. É, infelizmente o mesmo vício de raciocínio de Nuno Crato, quando pensa que é possível voltar ao paradigma dos antigos liceus, dos alunos que vivem só para exames, para entrar na universidade.

Parte do princípio que antes, “nesses tempos fundadores”, os professores não faltavam e hoje faltam. Dados não lhe interessam, mas sim afirmações, baseadas na sua opinião, no seu senso comum, sem que se dê ao trabalho de ir ao terreno, ver o que é uma escola e informar-se que é o dever de um jornalista. É o mesmo pensamento reacionário de tantos que, partindo dos seus preconceitos, decretam a verdade. Infelizmente há muitos por aí. Arrogantemente pensam e proclamam, inculcam, repetem até à exaustão, do alto das páginas dos jornais, numa comunicação unilateral, gostam de ofender, como se isso fosse coragem, satisfazem-se como Narciso a apreciar a sua própria imagem nas águas, mas … “o mundo pula e avança”. E o mundo de hoje, já tem muito mais gente com instrução e que sabe pensar, sem precisar das ideias feitas e das verdades inquestionáveis, “ex-cathedra”.

Junto esta imagem de um livro com muitos depoimentos, onde também contei a minha memória das escolas em que andei.