A
visita do presidente da República a Moçambique correu bem, até foi alegre e
meteu dança. Nada de mal ou até tudo bem, até para esquecer a má disposição
crónica do anterior presidente sectário. Mas o presidente Sousa confundiu
algumas posições pessoais e o hábito de comentar tudo com a função de
presidente que representa a República Portuguesa e os seus compromissos a
propósito do Acordo Ortográfico. Apelou até, numa linguagem dúbia, para que
Moçambique e Angola não ratificassem o Acordo Ortográfico, que já aprovaram há
longos anos, mas ainda não ratificaram.
Os
problemas destes países têm sido, antes de mais os custos e as prioridades, e
não qualquer posição purista ou de natureza linguística. Os problemas que têm,
desde as guerras passadas e ameaças de recrudescimento, às questões de
desenvolvimento, desigualdade, instabilidade, corrupção … são preocupações
muito mais importantes do que a normalização de uma escrita de uma língua que
muitos ainda não podem usufruir. Sim, e uma das prioridades seria o combate ao
analfabetismo e o uso da língua, como fatores de unificação nacional e
pressuposto para o desenvolvimento. E também é isso que eles dizem.
Parece
estranho mandar recados em discursos oficiais, para cá, em países que são
independentes. Suponho que não foi essa a intenção mas não se pode cair no
risco de confundir um estado que tem uma dinâmica própria, e é independente,
com as emoções de quem lá foi de férias quando era jovem e o pai administrava a
colónia. Mas mais ainda, não se pode cair também na tentação de, através do “porreirismo”
paternalista, abdicar da posição da chefia e representação do estado português,
que fez, como outros em pé de igualdade, acordos internacionais e simular que
se mete uma cunha a outro estado para ajudar a polémica em Portugal e tentar
reverter o que foi acordado com diferentes estados, sem que alguém lhe tivesse
dado mandato para isso.
Continua-se
a discutir o Acordo Ortográfico de uma língua que é comum a vários estados e
que não é propriedade exclusiva de nenhum, mas património comum. Continua-se
deliberadamente a confundir fala com escrita, como se por magia, todas as
centenas formas de falar o português se unificassem ou se pervertessem por um
acordo.
Mas
a discussão já começou há muito tempo, e é pena que muitos só tivesse começado
a discutir dezenas de anos depois do acordado e ratificado por vários países.
Recordem-se algumas datas para além de outras:
1990 - Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa assinado a 16 de dezembro;
1996 - Ratificação do Acordo Ortográfico de 1990 por Portugal, Brasil e Cabo Verde
2004 - Celebração do Segundo Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que autoriza a adesão de Timor-Leste e prevê que basta a ratificação por apenas três países para que o Acordo Ortográfico de 1990 entre em vigor
2006 - Ratificação do documento oficial por Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe
2009 - Entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990 a 13 de maio
2010 - Guiné-Bissau ratifica o Acordo Ortográfico, faltando apenas a ratificação de Angola e Moçambique
1996 - Ratificação do Acordo Ortográfico de 1990 por Portugal, Brasil e Cabo Verde
2004 - Celebração do Segundo Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que autoriza a adesão de Timor-Leste e prevê que basta a ratificação por apenas três países para que o Acordo Ortográfico de 1990 entre em vigor
2006 - Ratificação do documento oficial por Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe
2009 - Entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990 a 13 de maio
2010 - Guiné-Bissau ratifica o Acordo Ortográfico, faltando apenas a ratificação de Angola e Moçambique
2011 - Novo Acordo
Ortográfico é introduzido no sistema educativo português no ano letivo de 2011-2012
2012 - Desde o dia 1 janeiro, órgãos, serviços, organismos e
entidades governamentais, bem como as publicações oficiais, passam a ter a sua
grafia adaptada
Estamos em 2016!
Quem quer reverter tudo, mesmo sem falar e acordar com os que
representam outras centenas de milhões que usam a língua portuguesa que também
é deles? Querem que todos os que usaram, por obrigação também, voltem a usar a
grafia dos anos quarenta (ou a anterior a 1911)? Querem que as crianças e
adolescentes “voltem” a escrever de uma forma que nunca usaram?
2 comentários:
Engraçado que esteja mais preocupado com não sei quantas mil crianças do que com dezenas de milhões de utilizadores da língua por esse mundo fora que foram forçados a mudar a sua forma de escrever. Incluindo jovens que já tinham sido ensinados na ortografia anterior. E como se a grande vantagem das crianças não fosse precisamente a capacidade de adaptação à mudança. Enfim... E essa conversa de a língua ser tão comum parece a conversa de antes do 25 de Abril de um Portugal do Minho a Timor. Haja pachorra para tanta falta de senso.
A sua pachorra de anónimo e de engraçado (cito, mas ICE é quem?) de alguém que facilmente acusa e não parece compreender o que é um estado de direito e usa essa demagogia do Minho a Timor, como se a língua portuguesa fosse propriedade de alguns, que na maioria acordaram tarde. Assuma o seu nome e use argumentos. Se quer acusar anonimamente os outros de falta de senso, comece a ler umas coisas sobre educação que os outros também não têm a tal pachorra.
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