Nesta discussão deslocada (digo deslocada porque o que está em questão é o financiamento de privados com dinheiros públicos ao mesmo tempo que o estado desperdiça e não financia recursos pagos por todos) usa-se por vezes o argumento de que os pais trabalham e nas escolas públicas não há atividades para além das aulas, enquanto os progenitores estão ocupados.
Só em parte é verdade. Muitas escolas públicas também o fazem, e fazem mais que alguns privados que praticam a censura (nem todos e há que distinguir cooperativas a sério de empresas lucrativas), mas não fazem mais porque não as deixam fazer, isto é, porque o estado desvia verbas para os privados e para outros destinos e porque continua a centralizar tudo.
Se o Estado prescindir da prisão e teia burocrática, mesmo com menos recursos financeiros, as escolas, com autonomia a sério, com projetos próprios, diferenciados, poderão fazer muito mais, sem estarem sujeitas à inculcação de ideologias religiosas conservadoras (não confundir com religiões) ou reprodução e incremento de práticas sociais discriminatórias, inconcebíveis num estado onde todos têm direitos.
domingo, 8 de maio de 2016
O presidente Sousa e o Acordo Ortográfico.
A
visita do presidente da República a Moçambique correu bem, até foi alegre e
meteu dança. Nada de mal ou até tudo bem, até para esquecer a má disposição
crónica do anterior presidente sectário. Mas o presidente Sousa confundiu
algumas posições pessoais e o hábito de comentar tudo com a função de
presidente que representa a República Portuguesa e os seus compromissos a
propósito do Acordo Ortográfico. Apelou até, numa linguagem dúbia, para que
Moçambique e Angola não ratificassem o Acordo Ortográfico, que já aprovaram há
longos anos, mas ainda não ratificaram.
Os
problemas destes países têm sido, antes de mais os custos e as prioridades, e
não qualquer posição purista ou de natureza linguística. Os problemas que têm,
desde as guerras passadas e ameaças de recrudescimento, às questões de
desenvolvimento, desigualdade, instabilidade, corrupção … são preocupações
muito mais importantes do que a normalização de uma escrita de uma língua que
muitos ainda não podem usufruir. Sim, e uma das prioridades seria o combate ao
analfabetismo e o uso da língua, como fatores de unificação nacional e
pressuposto para o desenvolvimento. E também é isso que eles dizem.
Parece
estranho mandar recados em discursos oficiais, para cá, em países que são
independentes. Suponho que não foi essa a intenção mas não se pode cair no
risco de confundir um estado que tem uma dinâmica própria, e é independente,
com as emoções de quem lá foi de férias quando era jovem e o pai administrava a
colónia. Mas mais ainda, não se pode cair também na tentação de, através do “porreirismo”
paternalista, abdicar da posição da chefia e representação do estado português,
que fez, como outros em pé de igualdade, acordos internacionais e simular que
se mete uma cunha a outro estado para ajudar a polémica em Portugal e tentar
reverter o que foi acordado com diferentes estados, sem que alguém lhe tivesse
dado mandato para isso.
Continua-se
a discutir o Acordo Ortográfico de uma língua que é comum a vários estados e
que não é propriedade exclusiva de nenhum, mas património comum. Continua-se
deliberadamente a confundir fala com escrita, como se por magia, todas as
centenas formas de falar o português se unificassem ou se pervertessem por um
acordo.
Mas
a discussão já começou há muito tempo, e é pena que muitos só tivesse começado
a discutir dezenas de anos depois do acordado e ratificado por vários países.
Recordem-se algumas datas para além de outras:
1990 - Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa assinado a 16 de dezembro;
1996 - Ratificação do Acordo Ortográfico de 1990 por Portugal, Brasil e Cabo Verde
2004 - Celebração do Segundo Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que autoriza a adesão de Timor-Leste e prevê que basta a ratificação por apenas três países para que o Acordo Ortográfico de 1990 entre em vigor
2006 - Ratificação do documento oficial por Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe
2009 - Entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990 a 13 de maio
2010 - Guiné-Bissau ratifica o Acordo Ortográfico, faltando apenas a ratificação de Angola e Moçambique
1996 - Ratificação do Acordo Ortográfico de 1990 por Portugal, Brasil e Cabo Verde
2004 - Celebração do Segundo Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que autoriza a adesão de Timor-Leste e prevê que basta a ratificação por apenas três países para que o Acordo Ortográfico de 1990 entre em vigor
2006 - Ratificação do documento oficial por Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe
2009 - Entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990 a 13 de maio
2010 - Guiné-Bissau ratifica o Acordo Ortográfico, faltando apenas a ratificação de Angola e Moçambique
2011 - Novo Acordo
Ortográfico é introduzido no sistema educativo português no ano letivo de 2011-2012
2012 - Desde o dia 1 janeiro, órgãos, serviços, organismos e
entidades governamentais, bem como as publicações oficiais, passam a ter a sua
grafia adaptada
Estamos em 2016!
Quem quer reverter tudo, mesmo sem falar e acordar com os que
representam outras centenas de milhões que usam a língua portuguesa que também
é deles? Querem que todos os que usaram, por obrigação também, voltem a usar a
grafia dos anos quarenta (ou a anterior a 1911)? Querem que as crianças e
adolescentes “voltem” a escrever de uma forma que nunca usaram?
domingo, 1 de maio de 2016
Moção sobre o 25 de Abril e 1º de Maio aprovada na Assembleia Municipal de Évora
Foi aprovada por unanimidade,na Assembleia Municipal de Évora, a 29 de Abril, esta moção que propus em nome da CDU, sobre o 25 de Abril e 1º de Maio:
Moção sobre
o 25 de Abril e 1º de Maio
“A Revolução do 25 de Abril restituiu aos Portugueses os
direitos e liberdades fundamentais (Prólogo da Constituição de 1976)”. O
Movimento das Forças Armadas, liderado pelos capitães, com o apoio e
participação coletiva do povo português permitiu que se começassem a cumprir as
palavras proferidas por Almeida Garrett na revolução de 1820:
Já
temos uma Pátria, que nos havia roubado o despotismo: a timidez [,] a covardia,
e a ignorância, que o tinham criado, que me prostravam com vil idolatria ante
as obras das suas mãos, acabaram. A última hora da tirania soou; o fanatismo,
que ocupava a face da terra, desapareceu; o sol da liberdade brilhou no nosso
horizonte, e as derradeiras trevas do despotismo foram, dissipadas por seus
raios, sepultar-se no inferno.
O movimento revolucionário de 25
de Abril de 1974, tomou nas mãos a regeneração de Portugal de forma corajosa
mas pacífica, deu a voz aos portugueses, desmantelando uma ditadura de longos
48 anos que comprometia o futuro de um país, que enviava em massa os jovens
para guerras coloniais que oprimiam também o desejo de liberdade de outros
povos, que expulsava da sua terra os camponeses, pela emigração, umas vezes
legal, tantas vezes clandestina, proibia as liberdades, denegava os direitos,
prendia e torturava os que erguiam a cabeça, impunha uma censura férrea,
antidemocrática, moralista e ultramontana, oprimia e rebaixava as mulheres,
usava a economia arcaica ao serviço de elites monopolistas que mal deixavam
sobreviver os que trabalhavam com salários miseráveis, mantinha uma parte
substancial da população no analfabetismo e na injustiça social, negava o
acesso à cultura e modernidade num clima de suspeição e medo, num estado
centralista e totalitário.
Foi também o 25 de Abril um
acontecimento internacional que acordou as esperanças de muita gente pelo mundo
fora, que permitiu a independência das ex-colónias, que iniciou a “terceira vaga”
da democracia que haveria de transformar tantas nações.
Foi possível romper com o
fatalismo, mesmo num conjuntura económica difícil e, apesar das pressões
externas, manter a soberania nacional e melhorar as condições de vida do povo
português.
“O dia inicial
inteiro e limpo/ onde emergimos da noite e do silêncio” (Sofia Andresen), “as
portas que abril abriu”(Ary dos Santos),
tornaram possível também a transformação do aparelho de estado, a dignificação
do estado de direito, eleições livres, não apenas para a eleição de deputados
nacionais e presidente da República, mas também para as autarquias locais, a
elaboração de uma Constituição que este ano fez 40 anos,
onde estão consagrados os direitos cívicos e políticos democráticos mas também
os direitos sociais e culturais, “tendo em vista
a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno” (Prólogo da
Constituição).
Tudo
isto foi possível também, pela longa resistência e persistência de muitos
portugueses e portuguesas, “mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão”
(Manuel Alegre), lutas que atingiam uma das maiores expressões no dia 1º de
Maio, proibido pela ditadura, dia também de intervenções repressivas, mas em
que, apesar das prisões políticas, havia sempre quem cantasse: “vá camarada
mais um passo/ já uma estrela se levanta/ cada fio de vontade são dois braços/
e cada braço uma alavanca” (Hino de Caxias).
Tal
como escrevia com entusiasmo Almeida Garrett, tornou-se possível a liberdade, e
continuará, se lutarmos por essas conquistas:
Escravos
ontem, hoje livres; ontem autómatos da tirania, hoje homens; ontem miseráveis
colonos, hoje cidadãos; qual seria o vil (não digo bem), qual seria o infeliz
que não louve, que não bendiga o braço heróico que nos quebrou os ferros, os
lábios denodados que ousaram primeiro entoar o doce nome Liberdade?
Assim, a Assembleia Municipal de
Évora, em 29-04-2016, reunida no Salão Nobre dos Paços do Concelho, uma das
casas da democracia:
- Saúda todos os que participaram
na construção do regime democrático no espírito da revolução de 25 de Abril;
- Apela à participação dos
cidadãos nas lutas pela justiça social e direitos inalienáveis dos
trabalhadores, no dia 1º de Maio.
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