domingo, 23 de janeiro de 2011

Presidenciais: requiem

Nestas presidenciais há fortes sinais que o sistema político vai ter que mudar.
A abstenção é enorme, o que indica um mal estar em crescendo. Muitos não se sentem representados.

O tabu da Madeira caiu: foi certamente um voto de protesto, conjuntural, mas vai fazer mossas. É impressionante como José Manuel Coelho conseguiu juntar as assinaturas e como teve tantos votos, sem qualquer máquina de propaganda ou publicidade atrás. As pessoas estão fartas.
 Ele e Defensor Moura conseguiram irritar Cavaco que agora passou ao ataque, prometendo ser mais interventor. Fez um discurso que mais parecia de um primeiro-ministro.

Pergunta-se agora o que vale o Partido Socialista.
Sem números certos nem definitivos, sabendo que o Bloco de Esquerda apoiou Manuel Alegre desde sempre e até ao fim, juntando outros eleitores que não são do Bloco de Esquerda nem do PS, quantos eleitores do PS terão votado em Manuel Alegre?
Menos de 10%, pelo menos.

Não se percebe esta estratégia, até suicida, do Partido Socialista. O que é que queriam provar? Que Manuel Alegre era demasiado radical, que deveria ser arrumado na prateleira?

O erro foi demasiado grande. A conclusão que se tira é que não se pode confiar num partido nem num governo que apoia um candidato em que os militantes e eleitores são uma minoria, como nunca o PS teve.

Com um presidente que promete ser mais interventivo, com uma contestação surda que pode começar a ser ruidosa, este governo vai começar a ter demasiados problemas para se sustentar. Certamente alguns "coelhos" vão começar a "saltar da toca", como já demonstraram, pelo silêncio, nesta campanha. E não falo dos "coelhos" que saem do governo para as empresas e ainda têm o desplante de dar conselhos para que o povo pague mais impostos, receba menos vencimento, porque isso é um dos cancros deste país que só se pode resolver com uma mudança a sério.

Certamente o presidente "novo" e "apolítico" vai tentar manter o governo, enquanto os mercados que mandam nisto tudo quiserem. Quando achar que é altura vai ser implacável. Depois, entre a cópia e a fotocópia (PSD/PS) os eleitores hão-de escolher qualquer coisa ou ficar em casa.

 Sente-se cada vez mais a necessidade de acabar com um sistema em que os partidos se sobrepõem a tudo e afastam os deputados que pensam pela sua cabeça e querem representar os eleitores e prestar-lhes contas.

Nunca defenderia a marginalização dos partidos, nem a tentação do populismo, mas há que dar um papel maior aos deputados e dar a possibilidade de serem eleitos e continuarem a defender o seu programa mesmo contra as decisões e raspanetes circunstanciais de chefias não eleitas pela população, o que leva a que se tenha que modificar a lei eleitoral.
Quem está instalado não quer. Mas há que fazer mudanças, ou então há-de vir para aí um FMI, um Sidónio ou um "botas" qualquer que nos levará outra vez à miséria, "orgulhosamente sós"

A traição do Partido Socialista

 A quente.
Já se esperava a vitória de Cavaco. Afinal o senhor sempre foi conivente com a política de José Sócrates, mas como sempre, como já o havia feito, distanciou-se agora, como se nada tivesse a ver com o assunto, como se não soubesse nada, ele que não sabe porque lucra tanto, não sabe como fez escrituras, não sabe nada destas coisas. Armou-se em vítima e ganhou. Mesmo com tanta abstenção!

Mas que partido é este chamado Partido Socialista? Que ideologia tem, o que é que o diferencia do PSD, a não ser de estar agora no poder e o outro amanhã? A não ser a distribuição de lugares do aparelho de estado e os subsídios escandalosos, no país com maior diferenciação social da Europa.

Nem sequer uma estratégia para as presidenciais?

Manuel Alegre recebeu o presente envenenado de José Sócrates, o homem encarregado, e contente, de impor a política que agrada ao sistema financeiro internacional.

Mas ao menos os militantes do Partido Socialista poderiam ter alguma coerência. Se é para apoiar é para apoiar; não é andar contra e a favor e ao mesmo tempo apoiar outros. Na Assembleia da República exigem a disciplina de voto sob as ordens da chefia. Se não obedecessem são expulsos, como foram os que votaram contra o novo Código de Trabalho ou contra a avaliação de professores.

Aqui não, ou antes, talvez tenham recebido as ordens da chefia para distribuir os votos, uns por Fernando Nobre, outros noutro lado, outros ainda para ficarem em casa para que Cavaco ganhasse.
Mal vai este país quando um partido, chamado socialista não, tem vozes que se afirmem.

Credibilidade nesta gente? Nenhuma. Mexam-se ainda os poucos que não estão totalmente comprometidos que já é tempo de começar reformas.

Viva a Tunísia

A Tunísia foi outro país esquecido propositadamente por muitos países que abusam da retórica da democracia. O mesmo aconteceu com Portugal, depois da 2ª guerra mundial. Quando muitos democratas portugueses pensaram que com o fim do nazismo(s) e fascismo(s), vencidos pelos aliados, chegaria a hora da democratização, cedo chegou o esquecimento, vencendo o pragmatismo da guerra fria.

Com a Tunísia, a Europa também se esqueceu da democracia. A França tinha interesses, como antiga potência colonial de que não se esqueceu, numa Europa que ainda continua a repartir interesses. A União Europeia, os EUA e outros têm fingido não ver, ou então até afirmavam que na Tunísia nem era tudo mau, que as mulheres até andavam de cara destapada (propositadamente confundem o Maghreb com outros países árabes), que os turistas até podiam ir às praias sem serem incomodados. Até a Internacional Socialista fazia vista grossa.

Esquecia-se a tortura, a censura, a corrupção.

Simpatizo com a Tunísia por motivos histórico e culturais. A Tunísia fez parte da cultura romana que era a nossa; vejam-se as ruínas romanas com uma dimensão maior que as que encontramos em Portugal. Antes, tinha sido o cerne do império cartaginês, donde saíram generais como Haníbal, que assustou Roma com as suas tropas, a maioria saída da Península Ibérica. Foi da Tunísia que saiu um dos maiores pensadores cristãos, Santo Agostinho, Doutor da Igreja. É na Tunísia que continua ainda a música andaluza, dos mourisco expulsos da Península, como tantos judeus e cristãos-novos que aí também se refugiaram. A Tunísia participou da mesma cultura islâmica que no nosso território durou quinhentos anos, fora os que aqui se mantiveram adaptando-se aos tempos. Quantos daqui, ao longo de milénios, não foram para lá, quantos de lá não vieram para aqui e assentaram raízes?

A população da Tunísia exige democracia. Como nós no 25 de Abril.

Vêm alguns com os fantasmas do fundamentalismo, alguns dos que se esquecem do pior fundamentalismo aceite pelo fatalismo das necessidades capitalistas. Falo aqui da Arábia Saudita e outros países do Golfo Pérsico, onde se decapitam pequenos ladrões, se apedrejam mulheres ... tal como no Afeganistão, onde também se têm protegido facínoras.
Nem a cultura dos países do Magrehb é essa e de fantasmas também já estamos fartos. Também quando Portugal entrou numa fase revolucionária houve tantos que previam o Apocalipse e usaram tantos meios para que isto fosse em direcção aos seus interesses.

Há que apoiar estes movimentos que exigem a democracia. Talvez este movimento se espalhe para Marrocos, talvez ...

Um blogue interessante:

http://atunisiangirl.blogspot.com/

Dia de eleições


Hoje é dia de pensamento, de reflexão, decretado, e ainda bem. Ainda bem que há alguma lei que obrigue, em princípio, à reflexão dos cidadãos, já que a prolixidade das leis, decretos, circulares, interpretações unilaterais e compulsivas que se sobrepõem aos princípios, são mais do que o pão nosso quotidiano, coisa que vai aumentando com o IVA, os amigos deles e os cartéis da mesma família e companhias ilimitadas em offshores e sítios semelhantes.

Ao menos que haja um dia ou dois em que se pense sobre a Res Publica, em que não se esqueça o que não deve ser esquecido, em que se esqueçam as poeiras desses fumos que nos entorpecem.
Já estive várias vezes em mesas eleitorais. Na maior parte das vezes sem nada receber em contado e, das que recebi, fui oferecendo a quem por mim e por outros vão fazendo alguma coisa por nós e por outros. Quem está nas mesas prescinde de muitas coisas, não só por ser Inverno e as salas, desde as sete da manhã e para além das sete da tarde, muitas vezes mais horas, estarem geladas, mas também acalentadas pela participação de muita gente.
Muita gente do dia-a-dia, com as suas dúvidas, com as suas vergonhas de aparecer em público, com as suas dificuldades práticas, de andar, de ver. No mínimo, recordo ( e eles continuam), aqueles avós, por vezes guiados pelos netos, que vêm votar, com grandes dificuldades, mas que não desistem. Não desistem, porque passaram uma boa parte da vida, sem qualquer direito, sem poder participar com a sua opinião, com a sua contribuição para a comunidade. Durante décadas e décadas foram muitos, muitos mesmos, os que não podiam votar, porque eram analfabetos, porque eram mulheres, porque tinham os direitos políticos sonegados.

Muitos destes, quando vão votar, sentem-se renascer, sente-se que ainda estão a mostrar que toda uma vida que tiveram é uma reflexão continuada que merece ser exprimida, numa contribuição para uma melhor vida para todos.

É por isso que detesto toda essa conversa de que se gasta muito com eleições. Tanto tempo houve por aí uns senhores que poupavam nisso e veja-se a miséria em que nos deixaram até 1974. Felizmente são tempos passados que nós não havemos de deixar regressar.

Experimente-se a ver as pessoas a votar, e a ver esse "brilhozinho nos olhos", coisa que não aparece nos comentaristas de alguma opinião publicada.

Ainda há Esperança, Persistência e Convicções.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Presidenciais-2


Nestas questões relacionadas com eleições costumo distinguir as dimensões ética e política e procuro ser racional, apesar das ideologias que hão-de continuar, onde a visão do mundo e as perspectivas e prospectivas hão-de ser diferentes conforme a posição onde nos colocamos. A verdade é sempre uma procura e não uma finalidade encontrada, muito menos decretada. Mas o relativismo é o contrário do que se disse antes e a demissão é o favorecimento de quem já manda, a não ser que se transforme numa atitude de contestação, com uma acção que leve ao desmascaramento do sistema que se contesta. A simpatia pelas pessoas, até a simpatia pelas ideologias, não se pode sobrepor à necessidade de participar numa estratégia pragmática em que se vislumbre os objectivos essenciais de uma política, em que não se pode perder o essencial, mas preservar, continuar e lutar pelo que é importante.

Falemos dos candidatos. Se se candidatam têm que apresentar programas e responder às perguntas. O tempo execrável da censura já não é admissível. Quem se expõe tem que se apresentar e sujeitar-se ao questionamento, já que se propõe representar este país. E num país onde se quer cultivar a democracia, todos têm que apresentar-se e apresentar os programas, sem favorecimentos de instituições ou de televisões, sem tabus à partida, sem a presunção de que têm uma honestidade inquestionável, porque nada nem ninguém pode ser inquestionável, a não ser que desistamos do poder que delegamos em quem nos representa e que nos há-de dar contas, como nós daríamos se fossemos eleitos. Isso é uma conquista que vem de há mais de dois séculos e de que não podemos prescindir.
Aleatoriamente falemos dos candidatos. Saúdam-se quase todos pela disponibilidade em nos representarem.

José Manuel Coelho tem contestado uma situação em que muitos se sentem mal: o populismo, o nepotismo, as tentações e actos ditatoriais na Madeira, protegidos por alguns governos e presidentes que têm admitido o endividamento à custa de todos. Não usa propriamente o mesmo discurso de Jardim, até trata as pessoas sem ser malcriado, usa até de algum humor. Mas, assumidamente não é um verdadeiro candidato.

Defensor Moura (não conhecendo eu pormenores sobre a sua gestão autárquica) bate-se por causas importantes, como a regionalização e uma cultura cívica. Mas também não se assume, nem tem apoios, como um candidato a presidente.

Francisco Lopes é um homem honesto, lutador e coerente, mas não participa numa estratégia alargada para eleger um presidente que possa ter uma maioria.
Fernando Nobre tem uma actividade meritória na AMI, e certamente vai continuar. Tem descaído numa via populista, contra o sistema sendo do sistema, voluntarista, como quem se bate em duelo. Continuarei a apoiá-lo como presidente da AMI mas nunca como presidente. Um equívoco muito grande.

Cavaco Silva. Nada tenho a ver com ele. Se para muitos não interessa, a mim faz-me impressão como é que não deu por nada antes do 25 de Abril e como é que progrediu na carreira, mesmo sabendo que não sabia nada, apesar de se reputar como alguém que sabe muito e que não costuma ter dúvidas. Pessoalmente pouco me interessam pessoas que ganham lucros enormes de acções, enquanto eu e outros andamos a pagar impostos disparatados, que compram casas a empresas com off shores, enquanto eu e outros temos que andar a demonstra tudo às Finanças que nos levam tudo. Não digo que seja corrupto, mas anda rodeado de tantos, tem promovido tantos, é apoiado por tantos, mostra tanta ignorância sobre pormenores que o comum cidadão tem que demonstrar. Continuo a achar esquisito tanto esquecimento e enriquecimento dele e, sobretudo, dos amigos. Quanto à moral que apregoa também não o percebo: promulga leis, aprova políticas e depois diz que não concorda muito. Mas também não tenho dúvidas, há muito povo que perdoa, ou até pensa que é vítima de campanhas, de conspirações. Pode vir a ser um S. Sebastião sem setas.

Manuel Alegre também tem defeitos, como muitos. Ridícula é a acusação de ser caçador, como se alguém aguentasse uma invasão de coelhos, raposas e javardos por todo o lado. De há uns tempos há campanhas insidiosas sobre a guerra colonial. O homem esteve na tropa, aguentou-se e foi expulso do exército pelas suas posições políticas e foi impedido de estudar e viver em Portugal, ao contrário de outros que sabem tudo e não deram por nada, mas subiram. Ao menos tem um passado e um presente de luta e independência de ideias, coisa que parece pouco a alguns mas que é essencial nestes tempos, em que à conta dos credores, tudo se quer esvair,
Tem um problema muito grande: o apoio de um governo que tem feito favores aos mesmos que são apoiados por Cavaco Silva e que este apoia.

Contra os pretensos apolíticos que andam na política há décadas, contra esta gente que nos pretende submeter ao poder deste capitalismo financeiro especulativo, contra os oportunistas deste sistema, pela democracia, pelos direitos sociais e culturais, vou votar também em Manuel Alegre.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Presidenciais-1

  • Se fosse para votar num candidato a presidente da República que pensasse exactamente igual a mim, que quisesse fazer o que eu acho que está certo, mesmo assim teria dificuldades, porque dúvidas sobre o que é certo e sobretudo o que se deve fazer em circunstâncias variadas, tenho-as sempre e até as procuro, por uma questão de método e modo de ser. Mesmo para eleições para deputados também tenho dúvidas, embora haja mais alternativas, mais ideologias para escolher. Ainda por cima surge sempre a questão: porque é que são estes e não outros, o que é que eu fiz ou não para isto se manter ou melhorar? Porque se todos somos iguais perante a lei, todos também temos o direito e o dever de participar. Se não somos nós, porque não temos determinadas características, então temos o dever de apoiar os que ficam mais próximos de nós, embora não sejam o que idealizámos, até porque temos que contar com os outros, porque o mundo não se muda sozinho.
  •  Ficar paralisado, por via das dúvidas, é uma atitude, até legítima que, na prática, é um apoio indirecto a quem se mexe. Porque se não mandam uns, mandam outros e, se a maioria não quiser saber de nada, há-de vir algum armado em salvador que, se o deixarem, há-de mandar em tudo, até nas nossas consciências e mesmo nos nossos pequenos movimentos e atitudes. A história do mundo contemporâneo está cheia disso e, apesar de neste momento não estar em causa um regime mais ou menos democrático, continua a ser verdade que as liberdades não se dão, conquistam-se.