sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Ainda as Bíblias e os escritores

Falo em bíblias porque, no essencial, o Alcorão (agora há quem diga Corão, mas em português a palavra usada ainda leva o al, como quase todas as outras de origem árabe) é uma outra versão da Bíblia, adaptada a outros crentes, mais recentes historicamente, pois que Maomé viveu muitos séculos depois dos textos estarem fixados (ou não, mas isso é ainda outro problema). E aqui há também que não confundir com o ponto de vista cristão que juntou e dividiu em duas, o Antigo e o Novo Testamento (não é este que está em causa).
Se falamos de Bíblia, em sentido estrito e mais universal, é aquela escrita antes de Jesus (aliás Cristo não escreveu nada e quem escreveu foi muito tempo depois e com escolhas, para que os textos fossem mais coerentes entre si, o que nem sempre se conseguiu).

Só para realçar um pouco a ideia, tanto na Bíblia como no Alcorão os profetas são os mesmos e os anjos também. Aliás, Maomé, que era analfabeto no início, recebeu as mensagens através do anjo Gabriel, o mesmo que anuncia outras coisas e que fala com Maria, também venerada pelos muçulmanos, tal como Jesus para eles é um dos grandes profetas.

Ora o Deus que aparece na Bíblia, nas várias versões antigas, é frequentemente arbitrário e exclusivista, protegendo uns, arrasando outros. Costuma-se dizer que os desígnios de Deus são insondáveis. Trata-se de Fé e contra a Fé, por natureza, não há argumentos racionais, porque não se trata de Lógica mas de Crença.

Escandalizam-se alguns, mas também são parciais. José Rodrigues dos Santos publicou agora um livro explícito no seu título:  Fúria divina. Vende-se mas não dá escândalo. Porquê? Afirma mais ou menos o mesmo que Saramago e vai até mais longe ao referir o Alcorão. Se fosse vendido no Afeganistão ou na Arábia Saudita (clandestinamente claro) certamente teria grandes problemas. Aqui não, felizmente. Nem os muçulmanos portugueses reagiram como alguns católicos em relação a Saramago.

Mas se houver alguém que publique um livro do mesmo género em que se baseie só na Bíblia que os judeus usam seria acusado de anti-semitismo.

Mas afinal não é mais ou menos o mesmo? O Deus dos Exércitos, o Deus arbitrário e vingativo está nestas Bíblias.
Alguns dos que acharam graça às caricaturas de Maomé saídas num jornal dinamarquês e que acharam indmissíveis as reacções de alguns muçulmanos, agora indignam-se com Saramago.
Será que ainda pensam que são o Povo Eleito (bíblico), com exclusão dos outros e que a indentidade portuguesa ou europeia obriga a que sejam castigados os blasfemos e que os restantes façam profissão de fé?

Há quase cem anos (faz este ano) foi proclamada a República com a separação do Estado e das Igrejas. Já antes noutros países também. Na Turquia desde a década de vinte.

Já era tempo de alguns perceberem isso.

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