quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Sobre a gestão das escolas.

Declaração de interesses: sou professor do ensino secundário há muito, costumo participar na escola e fora dela, sou pai e tenho 3 filhos e não acredito no discurso salazarista de que os portugueses não estão preparados para viver em democracia.

No projecto de Decreto-Lei sobre gestão das escolas prevê-se um Conselho Geral que, em princípio, tem amplos poderes. Digo, em princípio, porque não basta a enunciação desses poderes, esses só serão efectivos se os respectivos membros participarem, propondo, reflectindo, aprovando, fiscalizando … O que significa que é preciso trabalhar, dispor de tempo, dispor de si e das instituições que se representa, oferecer contrapartidas para o bem comum. De contrário, se não houver participação alguém irá utilizar o poder por “falta de comparência.

Porque as escolas têm o seu dia a dia e não podem parar.

Quem participa? Professores, pessoal não docente, representantes da autarquia local, pais e encarregados de educação, alunos (ensino secundário), representantes da autarquia local e representantes da comunidade local.
Vejamos algumas competências do Conselho Geral
a) Eleger o respectivo presidente, de entre os representantes das autarquias, dos pais e
encarregados de educação ou da comunidade local;
. Exclui-se do cargo os professores, o que significa que esta função e este trabalho terá que ser exercido por um pai, um representante da autarquia …
b) Seleccionar e eleger o director. O director vê reforçados os seus poderes, é presidente do Conselho Pedagógico, nomeia os seus membros, é responsável pela gestão quotidiana, distribui o serviço docente, é avaliador de funcionários e professores etc. etc. Inclusivamente pode ser alguém que não conheça a escola. É avaliado pelo Conselho Geral (se este o fizer).
c) Aprovar o projecto educativo e acompanhar e avaliar a sua execução;
f) Apreciar os relatórios periódicos e o relatório final de execução do plano anual de
actividades;
h) Definir as linhas orientadoras para a elaboração do orçamento;
i) Aprovar o relatório de contas de gerência;


Para definir, aprovar, apreciar, acompanhar, é preciso conhecer bem e discutir, estar atento e disponível.

O legislador definiu também que os professores eleitos devem estar em minoria. No regime transitório os membros serão sete representantes do pessoal docente; dois representantes do pessoal não docente; cinco representantes dos pais e encarregados de educação; três representantes da autarquia local; três representantes da comunidade local. Nas escolas com ensino secundário haverá um aluno e quatro encarregados de educação. Os representantes das instituições e actividades de carácter económico, social, cultural e científico são cooptados pelos restantes membros.
O modelo foi parcialmente copiado de outros países da União Europeia. Os países escandinavos, por exemplo, têm uma forte participação das instituições e comunidades locais. Mas há diferenças. As autarquias desses países tratam as escolas como suas e participam com dinheiro e recursos humanos e materiais e interessam-se pela sua gestão porque o investimento também é delas, assim como os benefícios esperados para as localidades ou país. Consideram que a Educação é responsabilidade de todos e que o desenvolvimento humano se faz com educação e instrução (veja-se os países com melhores índices de desenvolvimento humano). O estado limita-se a financiar parcialmente e supervisionar (a sério) sem impor comportamentos nem burocracias centralizadoras, extenuantes e inibidoras. As sociedades desses países têm um nível de instrução consolidado há muito, uma prática de respeito pelos indivíduos, pela lei e pelo assumir e exigir responsabilidades e aversão ao desperdício e demagogia. Não isentas de problemas e, referindo-nos aqui a práticas da maioria sociedade e não de alguns indivíduos, verifica-se também que os pais e a sociedade em geral responsabilizam os alunos pelo dever do trabalho. Basta verificar o número de horas em que os nossos jovens vêem televisão (o país onde se vê mais televisão na Europa) ou jogam em computadores ou outros aparelhos, as saídas nocturnas, a frequência de hipermercados, o número de livros lidos per capita etc. (há estudos sobre isso).

Até aqui tem havido uma Assembleia de Escola, onde participam um representante dos pais, da autarquia, funcionário, professores …O que se tem verificado na maioria das escolas é ou a falta de comparência de pais, a sua fraca disponibilidade ou até a quase ausência de representatividade. As autarquias, frequentemente enviam um funcionário sem poder de decisão e com o tempo contado. Sobram professores que, em algumas escolas (e ressalve-se que em muitas escolas as direcções incentivam a participação democrática) podem ser controlados, nomeadamente com a distribuição de serviço. Muitas assembleias têm-se revelado inoperantes.

E agora? Vamos esperar que a participação surja por decreto?

2 comentários:

José Manuel Chorão disse...

Opinião de um professor:
A política educativa deste (des)governo faz-me lembrar a atitude dos alunos cábulas: sem ter estudado adequadamente a matéria, aflitos a meio de um teste, deitam o olho para o teste do colega do lado e copiam o que conseguem ver; às vezes copiam mal: o que transcrevem não tem a ver com a questão a que tentam responder, o contexto do colega é outro; se servia para a resposta do colega, não é forçoso que sirva para a sua; mas como são burros, nem isso percebem...
Assim é a política deste (des)governo: sem perceber nada do que estão a tentar fazer, copiam soluções que, sendo adequadas em diferentes contextos e culturas, se mostram desastrosos se copiados para a nossa sociedade.
Eu não votei nesta gentinha sem inteligência nem vergonha na cara. Mas tenho pena dos amigos que neles votaram e agora se sentem traídos. Espero que a sua mágoa não seja revogada com algum rebuçadinho na véspera das próximas eleições: um povo sem memória é um povo sem carácter.

Anônimo disse...

Estive a ler este texto e deixou-me a pensar. Sim, realmente infelizmente pode-se verificar que poucos pais vão á escola, isso também se deve á sociedade que temos. Dando um exemplo, o meu pai sai de casa ás 6 e tal da manha e entra muitas vezes em casa ás 8 da noite, é dificil para muitos pais irem ás escolas. Mas de quem é a culpa? É da forma que tudo está feito, as pessoas trabalham muitas horas para dar uma "melhor" vida aos filhos. Mas eu no entanto, dou por mim a pensar, será que o esforço do meu pai não será em vão? Não digo isto por ser "baldas" como alguns conhecidos meus, mas porque sei que cada vez isto está mais dificil. Também é verdade que cada vez mais os jovens dão mais valor á televisão do que a um livro ou a uma brincadeira de crianças. Eu quando era miuda, ia brincar para a rua, nao tinha videojogos nem nada do que os miudos têm hoje, e era feliz... E ficava contente quando os meus pais chegavam a casa, nao fazia birra para me comprarem o que queria, nem era egoista. E antes de dormir a minha mãe lia-me uma historia, quando aprendi a ler, ia buscar livros á biblioteca municipal, ou pedia á minha mae para comprar quando ela podia. Coisa que ela nunca me negou, foi a comprar livros. Mas nao é mais fácil deixar um miudo sossegado a jogar? Ao menos não chateia.. Acho que este é um pensamento muito vulgar. No entanto, tal como o professor disse é muito dificil mudar mentalidades, e acho que será dificil mudar a dos Portugueses.