sábado, 21 de setembro de 2013

Évora será cidade

Por vezes é preciso ter memória. Quando se fala em autarquias, em eleições, em poderes autárquicos é preciso recordar algumas coisas, mas não reviver o passado.
Até 1974, durante o Estado Novo, os presidentes das câmaras eram nomeados pelos governadores civis, por sua vez nomeados pelo Ministro do Interior (o mesmo de quem dependia a PIDE/DGS, ou que dela dependia), nomeado pelo Presidente do Conselho. Autonomia não existia, os presidentes das câmaras, quando muito pedinchavam qualquer coisa, servilmente, ou defendiam os interesses de grupo, também servilmente. Dinheiro não havia quase, que era quase tudo para as guerras coloniais e para os grupos que se serviam do Estado para enriquecer num estado controlado, onde não podia haver greves nem manifestações nem direitos cívicos, políticos ou sociais.
Évora não podia crescer. Era a cidade intra-muros, com alguns bairros admitidos e dezenas de bairros clandestinos, porque as pessoas fugiam dos campos e tinham que viver em algum lado.
Fez-se um esforço coletivo imenso após o 25 de Abril. Participou muita gente anónima, inúmeros grupos de voluntários, moradores, outros que vieram de fora, fizeram-se experiências urbanísticas com a participação da população, urbanistas e arquitetos que haveriam de ser reconhecidos internacionalmente, como Siza Vieira e Nuno Portas, mas desprezados por alguns “esclarecidos” suburbanos que ascenderam rapidamente.
Évora recomeçou a ser reconhecida nacional e internacionalmente pelas escolas de teatro, pioneiras, por festivais de música, tantas manifestações culturais. Milhares de famílias não tinham sequer água e esgotos, no centro e nos bairros clandestinos e começaram a ascender às condições mínimas- à dignidade!, o que é pouco para gente satisfeita com o seu umbigo e que faz da ignorância um gesto contínuo de arrogância.
Évora chegou a Património Mundial, coroando esforços, estudos, participação de muitos cidadãos que demonstraram que Évora poderia ser uma cidade, cosmopolita, aberta, inovadora. Havia problemas, certamente, mas participação de muitos e vontade de resolvê-los.
Infelizmente, porque noutras regiões do país há diferenças, grande parte dos que mandam no Partido Socialista local foram-se organizando contra tudo o que eles entendiam que era comunista, sem ver sequer que muito do que se fazia era o que uma cidade digna desse nome, uma cidade de cidadãos, era muito maior do que preconceitos que qualquer reacionário (aquele que não quer mudar e que age contra) subscreveria. Alguns nem sabem que o Partido Socialista, na sua fundação, se proclamava como herdeiro do marxismo, que propunha também uma sociedade igualitária e que ainda mantém oficialmente como hino a Internacional.
O PS local, que durante muitos anos esteve na oposição, contestando apenas, conseguiu tornar-se poder. Como os que mandam no PS local não tinham programa, como se habituaram a ter lugares de nomeação (CCDR, governo civil, EDIA …) o seu programa foi destruir e mostrar quem manda. Não olharam a meios publicitários e propagandísticos, utilizando o aparelho de estado a seu favor, alianças espúrias, favores de empresas, favorecidas também. E ainda pensam que são importantes, socialmente, imprescindíveis. Pensam que são uma espécie de self made man à portuguesa, porque partiram da aldeia e conquistaram o poder, esquecendo-se que o poder que lhes foi dado nessa instituições que lhes permitiram subir, o foi através de uma rede caciquista que nada tem a ver com mérito e muito menos com princípios democráticos.
Hoje saúda-se que tem coragem de querer estar à frente desta autarquia, com vontade de mudar, através de eleições democráticas. Porque a cidade de Évora está minada, falida, o centro histórico com problemas de difícil resolução, esventrado e sem gente, porque os que têm mandado têm desprezo, raiva e inveja pela vivência numa cidade, até porque o seu ideal suburbano é o de uma cidade para a fotografia, onde os que podem circulam nos seus automóveis rapidamente e descansam nas suas vivendas com piscina, enfadados do bulício, das misturas sociais – da cidade.

É preciso devolver o cosmopolitismo a esta cidade, elevar a participação das populações, reconstruir o que tem sido desfeito.

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