terça-feira, 1 de julho de 2008

É tempo de praia

Do meu primo Zé uma crónica saborosa sobre outros tempos de praia, publicada no jornal "Terra Ruiva".

É TEMPO DE PRAIA
Por: José Baeta Oliveira
(Zé Baeta)

Pela parte que me toca, a minha praia é a de Armação de Pera. É mesmo raro ir à praia, no sentido de estacionar na areia ir dar uns mergulhos e umas braçadas, regressar à areia e estender-me ao sol e/ou à sombra, sem ser em Armação de Pera.
O mesmo se passará, penso eu, com muita malta de Silves, cuja temporada de praia se compõe, agora, de umas idas e vindas a Armação de Pera ou então, permanência em casa própria ou alugada.
Dantes, há muitos antes, não era exactamente assim; a temporada de praia da malta de Silves era composta de duas fases.
Uma primeira fase consistia na ida, aos domingos, à Praia da Rocha, pois para ir a Armação, o trajecto de camioneta era muito grande e caro, com uma mudança em Lagoa e outra em Alcantarilha... e muito pouca gente tinha transporte próprio.
Digo aos domingos, porque ao sábado era dia de trabalho ou de escola, pelo menos de manhã, (esta parte não é de saudade), mas importa registar que já há gente a trabalhar, de novo, ao sábado e muitas horas durante a semana, enquanto muitos outros não têm trabalho. Dos que não têm trabalho, só uma pequena parte é porque não quer! Os que dizem que não é assim, que vão trabalhar pelo preço e condições que querem pagar a quem procura trabalho (porque emprego, já nem se pensa nisso)!
As carreiras regulares e directas para Armação só começavam a 15 de Julho. Então a opção, nesta primeira fase, era ir à Praia da Rocha, fazendo um trajecto não menos complicado mas economicamente mais em conta. Eram “ranchos” de gente, em grupos, familiares ou outros, a subir a Ladeira da Estação para apanhar o “Chora” cujo horário seria às 8H20 mas que nunca abalava a essa hora. Muitas vezes, a essa hora, ainda não tinha chegado à Estação.
O “Chora” era o combóio de mercadorias que arrastava na cauda uma carruagem de passageiros com bancos de “suma-pau”. No horário do Domingo de manhã, até começar a carreira directa de camioneta para Armação, ia de lotação mais que esgotada. Ao aproximar-se de Estômbar, num troço de linha ligeiramente inclinado, diminuía a lotação pois muita malta descia do comboio em andamento lento, ia apanhar figos e regressava mais adiante ou voltava a apanhá-lo em Estômbar, onde tinha nova paragem prolongada. Seguia-se a estação de Ferragudo, no Parchal/Aldeia dos Cucos, onde desciam algumas famílias para fazerem o resto do trajecto, a pé, até à Praia de Ferragudo. A maioria continuava até Portimão, caminhando depois, também a pé, pelo menos até ao largo das camionetas, onde a carreira da “Castelo & Caçorino” aguardava até esgotar a lotação; só então abalava para a Praia da Rocha. Quem tivesse dinheiro e disposição para esperar pela segunda volta, ali ficava a ver os cartazes do cinema ou apanhava uma “carrinha” puxada a cavalo, como a do Jaime Loulé que também fazia, aqui em Silves, o transporte para a e da Estação.
Grande parte da malta, ou porque não estava na disposição de esperar ou porque não dispunha de dinheiro, continuava o caminho até à Praia da Rocha, umas vezes a pé, outras vezes andando. Uma vez lá chegados, davam-se os primeiros mergulhos e, caso a maré estivesse vazia, pois com a maré cheia não haveria espaço para tal, ocorriam as jogatanas de futebol. Quando a fome batia horas no estômago lá ia a sandes, ou a peça de fruta, ou a solidariedade de alguma família armada de farnel.
Da parte da tarde, uma soneca, uma passeata ou umas carícias com namorada oficial ou não (ou com namorado, as moças) e mais umas banhadas.
Acabadas as banhadas da tarde, era tempo de retomar a caminhada para a estação de Portimão, a fim de embarcar, desta vez na automotora, em direcção a Silves. Depois, a descida da Ladeira da Estação.
Antes de acabar o curto fim de semana, ainda haveria a oportunidade, para quem tivesse essa oportunidade, de ir ao cinema, ao “barracão do Mariani” ou, mais tarde, ao velho “Cinema Novo”.
A segunda fase começava no primeiro domingo a seguir ao 15 de Julho, agora sim, em direcção a Armação de Pera; viagem menos conturbada, directa e com lugar sentado. O decorrer da jornada de praia, propriamente dita, era semelhante. Só que em Armação, com maré cheia ou maré vazia, havia sempre lugar a jogos de futebol. O mais importante era sem dúvida alguma, junto à Praia dos Barcos, em terreno inclinado, entre Silves e Armação de Pera, muitas vezes com jogadores do “Silves Futebol Clube” a alinhar em ambas as equipas.
No regresso, era muitas vezes demorada a chegada do “desdobramento”. Mesmo tendo uma estimativa da quantidade de gente que tinha abalado de manhã em direcção a Armação, nem sempre a “EVA” previa a necessidade de ter às horas de regresso, camionetas em quantidade suficiente para transportar, de regresso, os clientes mais que certos. Até parece, relativamente a estas e outras coisas, que tanto tempo não passou por cima destes factos...
Quantas vezes não terá feito o trajecto de Armação a Silves, em “desdobramento”, a camioneta do Félix, o “chofer maluco” de Armação, apenas treinada para fazer o circuito Pera-Alcantarilha-Armação. E quantas vezes não terá parado no caminho...Ainda há dias fui, de carro, a Armação. Então não é que, mesmo com um carro relativamente bem comportado, ia ficando pelo caminho de regresso a Silves... É que tinha querido abastecer-me de combustível e não havia nas bombas ... arrisquei a viagem e lembrei-me da camioneta cujo “chofer” era o Sr. Félix, de Armação de Pera.

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