O título é só por necessidade de haver um. Nem geração rasca, nem à rasca. Todas as gerações tiveram os seus problemas. Mas não vale a pena comparações, sobretudo quando se pretende valorizar uma em detrimento de outra, numa sociedade onde as diferenças sociais ainda são desmesuradas. Há muitas gerações, e os que vivem agora, não são só do “meu tempo” mas também deste momento.
Estas manifestações surpreenderam muitos, sobretudo alguns arrogantes opinadores pouco dados aos estudos sérios. A diferença entre opinião pública e opinião publicada tem sido enorme e já há pouca paciência para ouvir os comentadores habituais, mesmo da imprensa dita séria. Num mundo globalizado, já parece mal tanto provincianismo numa sociedade me que muita gente já ultrapassou isso. Cosmopolitismo não é só viajar de avião, é também perceber que há outros mundos, por vezes mesmo em frente aos nossos olhos.
A sociedade portuguesa mudou muito rapidamente. Muitos jovens de hoje estudam, felizmente muito mais que os pais e os avós. Poder-se-á falar da qualidade, mas também não me venham com a qualidade dos estudos antes do 25 de Abril, num país encerrado em fronteiras, quase sem investimento na educação, com uma censura permanente e corrupção, onde quem queria aprender outras coisas tinha que fugir. Por vezes confunde-se tudo com a média, mas o facto é que há áreas de excelência, a par de outras medianias.
Hoje, além de haver muito, mas incomparavelmente, mais gente a estudar e investigar, é frequente ir-se para outros países, como antes alguns iam de Évora para Lisboa. As fronteiras esbatem-se perante este viajar físico mas também por recentes formas de comunicação, do telemóvel com SMS às redes sociais. Lembremo-nos que há uns anos o governo de Aznar em Espanha caiu, porque mentiu, e foi desmascarado na rua, por gente que comunicou rapidamente através dos telemóveis. Hoje, se no Egipto, na Tunísia, as redes sociais funcionaram, mais fácil seria aqui, onde mais gente tem acesso. Isso aconteceu e formaram-se das maiores manifestações em simultâneo desde o 25 de Abril, em Lisboa, no Porto … até em Barcelona …
Há problemas sociais que estão a rebentar, e novas formas de manifestação, de discussão, tomada de consciência que as instituições já não controlam. Um dos primeiros sinais, em Portugal, foram as manifestações de professores que ultrapassaram todas as expectativas do governo, sindicatos e partidos políticos.
Surpreendentes têm sido estas manifestações, sobretudo as deste fim-de-semana, pela quantidade de pessoas e pela aparente falta de organização. Noutros países, com muito menos pessoas teria havido tumultos e confrontos. É impressionante como se conseguiu que duzentas mil pessoas na rua, só em Lisboa, na rua, tivessem conseguido fazer uma manifestação pacífica, com reivindicações variadas e com humor. Fez-me lembrar algumas manifestações a seguir ao 25 de Abril, quando quase todos procuravam escutar-se e não havia obediência a palavras de ordem nem a direcções partidárias. Interessante também, que muitas das músicas e frases ditas e cantadas retomavam temas da altura.
As manifestações, a tomada de consciência, vão ter necessariamente consequências e estão a pôr em causa as instituições do poder, os partidos do sistema vinculados à ideologia totalitária, unidimensional da economia (única?) e das finanças (que mandam mais ainda), baptizadas com o nome de mercado, como se o mercado fosse só isso. Falemos sobretudo do PS, PSD e CDS que quase não se distinguem. Mas mesmo outros têm que reflectir sobre tudo isto e saber porque estão a envelhecer. Tal como os sindicatos, onde muitos já não se revêem. Mas o discurso de “depois de nós, o caos”, também não serve. Não estamos perante multidões à espera de um salvador, mas de gente farta de ser explorada que sabe fazer muito mais do que não lhes pedem.
Não seria a altura de começar a rever também o sistema eleitoral e o funcionamento do Estado? Tanto se lutou para termos mais gente instruída, um pressuposto da democracia e da República e agora que temos tantos vamos desperdiçar os ideais, os sonhos, as utopias de tantas gerações, de outras, da minha, de todos os que aqui vivem?
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